Fonte: Folha de S. Paulo Caderno: Ilustrada Acervo pessoal de Paulo Autran reunido no Instituto Moreira Salles revela os bastidores do teatro brasileiro no século 20 MARCELO BORTOLOTI DO RIO Em 1974, o jornal "Correio do Povo", de Porto Alegre, recebeu uma carta de leitora que se queixava do excesso de palavrões na peça "Dr. Knock", de Jules Romains, dirigida e adaptada por Paulo Autran (1922-2007). Publicada no jornal, a carta irritou Autran. Em resposta manuscrita, cujo original guardou até o fim da vida, ele começa tratando-a de "pudibundíssima senhora". E prossegue: "Fiquei muito preocupado com seus problemas. Em primeiro lugar seus problemas auditivos. A senhora ouviu palavrões no teatro durante um espetáculo que, por mero acaso, não os tem. Creio que houve uma pequena confusão. É possível que a senhora e suas filhas mocinhas tenham ouvido palavrões ao sair de casa, durante o trajeto para o teatro, como todos nós ouvimos diariamente na rua (...)". O manuscrito integra o acervo pessoal do ator arquivado no Instituto Moreira Salles, no Rio. Os documentos, guardados em 70 caixas e ainda não organizados completamente, revelam particularidades da personalidade de Autran, como sua dificuldade em lidar com as críticas. Entre os papéis, há mais de uma centena de fotos, além de cartas, livros e anotações. Uma das preciosidades do acervo é um texto inédito de ficção escrito pelo ator, em que recria um mundo sem teatro no ano de 2091. Autran era um homem meticuloso. Ao longo da carreira, organizou uma pasta para cada peça em que atuou ou dirigiu, com todas as críticas, fotos e informações, como o número de pessoas que foram ao espetáculo. "Ele sempre soube que era parte da história do teatro no país", diz a atriz Karin Rodrigues, com quem Autran foi casado, numa relação bastante particular, que começou na década de 1970. Nome fundamental da dramaturgia brasileira, com mais de 90 peças e atuações memoráveis na TV em novelas como "Guerra dos Sexos" (1983), de Silvio de Abreu, e no cinema, como "Terra em Transe" (1967), de Glauber Rocha, o ator teve um início de carreira incomum. Carioca criado em São Paulo, havia se formado em direito e pretendia seguir na profissão de advogado. Foi o incentivo da amiga e atriz Tônia Carreiro que o fez optar pelo palco. Em 1949, ele estrelou ao lado dela a peça "Um Deus Dormiu Lá em Casa", seu primeiro trabalho. Mesmo após a consagração, ele fazia questão de rebater as críticas que recebia. "Geralmente as críticas eram burras. Quando vinham de um Sábato Magaldi, ele aceitava", diz Rodrigues. Outra revelação do acervo são os altos e baixos da amizade entre Autran e Tônia. Comenta-se que, embora fossem grandes parceiros, eles competiam pelo sucesso. Em "Compreendo perfeitamente que não possamos mais trabalhar juntos para não por em risco nossa amizade tão bonita. Não compreendo, porém, que depois de tanto tempo tão ligados, você não tenha podido perceber em mim a artista que o país todo reconhece." A crise foi remediada quatro dias depois, com um novo telegrama: "Paulo, assisti ao tal programa. Você lavou minha alma e tapou a boca de muita gente. Também não precisava tanto, contei meu nome nove vezes, cruzes". Tônia Carreiro não estava disponível para entrevista. Seu filho, Cecil Thiré, diz que o episódio foi motivado provavelmente por Autran ter declarado que não queria mais trabalhar com sua mãe. Em seguida, numa entrevista pela TV, ele abrandou a fala Fonte: Folha de S. Paulo Caderno: Ilustrada DO RIO Uma das pérolas do acervo de Paulo Autran é um texto de ficção escrito pelo ator, no qual ele imagina como seria o mundo em 2091. O manuscrito, de três páginas, é uma crítica ao multiculturalismo e à ideia de que não há hierarquia entre as culturas. De acordo com o texto, essa ideia acabou levando a sociedade a um processo generalizado de relativização e fez com que as pessoas passassem a desacreditar no valor da leitura, do teatro e, por fim, do próprio raciocínio. O narrador conta que tudo começa em 2012, na Universidade de Duke (Califórnia), quando compreendeu-se que "o que era chamado de cultura até então, os valores, a moral, não eram senão uma ideologia imposta pelos senhores de antigamente às minorias oprimidas". A ideia se disseminou pelo mundo, provocando uma "libertação cultural" de todos e de tudo. Cada indivíduo passou a determinar sozinho sua própria cultura. A primeira consequência foi a desobediência geral à leitura, culminando na queima universal das bibliotecas, em 2030. No mesmo ano, o teatro é abolido. Em seu lugar, surgem espetáculos eletrônicos universais, com só uma projeção de cor. "É com orgulho que afirmo que a morte do teatro em 2030 foi um benefício para a humanidade, pois a partir dela fomos libertados da obrigação de pensar", diz o texto. (MB) Fonte: Folha de S. Paulo Caderno: Ilustrada Notícias do arquivo digital descrevem dos momentos de euforia à crise pela qual passa o legado de Freud Tema se tornou corrente nas páginas da Folha nos anos 1930, quando conferências eram divulgadas com alarde DE SÃO PAULO Em março de 1928, uma nota publicada na "Folha da Noite" tentava decifrar Sigmund Freud ao comentar um livro sobre psicanálise e educação: "A finalidade do "Freudismo" é, sem dúvida alguma, a educação dos instintos, principalmente dos instintos sexuais", diz o texto armazenado no Acervo Folha. Dois anos depois, o tema já se tornara relativamente corriqueiro nas páginas das Folhas, como o jornal era conhecido, por ter edições de manhã, à tarde e à noite. Noticiava-se que Freud ganhara o prêmio Goethe, a mais prestigiada láurea literária da Alemanha; artigos debatiam a teoria dos sonhos e conferências de Durval Marcondes (1899-1981), um dos pioneiros da psicanálise no Brasil, eram noticiadas com certo alarde. O fascínio por Freud e a história da psicanálise no Brasil podem ser acompanhados no Acervo Folha (acervo.folha.com.br). O acesso ao serviço é gratuito nessa fase inicial. DIVULGADOR O ápice dessa cobertura ocorreu entre os anos de 1945 e 1962 porque um dos controladores da Folha nessa época, José Nabantino Ramos (1908-1979), era aficionado por psicanálise. Tão aficionado que num período que viveu em Londres se submetia a seis sessões por semana. Em 1967, foi nomeado membro emérito da Sociedade Brasileira de Psicanálise. O próprio Nabantino Ramos, professor de direito da USP e do Mackenzie, escreveu sobre o assunto. Em 1946, publicou um texto sobre psicanálise e marxismo, um tema que só chegaria à mídia na década de 60. Sob a direção de Nabantino Ramos, a "Folha da Manhã" passou a publicar regularmente textos do pioneiro Durval Marcondes e criou uma coluna semanal de psicanálise, assinada por uma mulher, Virgínia Bicudo (leia mais no texto ao lado). No livro "Álbum de Família: Imagens, Fontes e Ideias da Psicanálise em São Paulo", o psicanalista Leopold Nosek reconhece o papel de divulgador de Nabantino Ramos: "Foi no jornal "Folha da Manhã" e na Rádio Excelsior que se escancararam as portas da divulgação psicanalítica. Pelo menos desde 1945 até o início dos anos A crise pela qual passa o legado de Freud com a ascensão das drogas que prometem acabar com depressão e crises de humores é o tema dominante desde os anos 80. Um título na capa do Mais! de 2006 capta onde foi parar Freud: "Pai Patrão". O título do livro que norteia a edição, da francesa Catherine Meyer, mostra que Freud já viveu dias melhores: "O Livro Negro da Psicanálise". Fonte: Folha de S. Paulo Caderno: Ilustrada Mulher assinou a primeira coluna sobre o tema DE SÃO PAULO Mulher, mulata e psicanalista. Apesar da conjunção incomum, para a época, de predicados, Virgínia Bicudo fez sucesso na década de 50 com colunas e um programa de rádio sobre psicanálise. Ela assinou entre 1951 e 1955 uma coluna semanal sobre o tema na "Folha da Manhã". Textos esparsos aparecem até os anos 70. Chamada "Nosso Mundo Mental", a coluna foi, ao que tudo indica, a primeira sobre psicanálise no Brasil. Com esse mesmo nome, ela fazia um programa na Rádio Excelsior, no qual dramatizava questões que queria analisar. Palestras dela no auditório do jornal atraíam mais de 300 pessoas. Anúncio sobre a coluna, publicado no dia 18 de maio de 1951, dizia: "A partir de domingo a "Folha da Manhã" publicará uma série de estudos sobre a função do aparelho psíquico, os desajustamentos infantis, os conflitos conjugais e outros temas de alto interesse humano". Bicudo (1915-2003) era socióloga e foi a primeira não médica a receber o título de psicanalista no país. Escreveu a primeira dissertação de mestrado sobre relações raciais, em 1945, diz Mariângela Moretzon, da Sociedade Brasileira de Psicanálise. "Ela foi uma neta de escravos que chegou a ser aluna de Melanie Klein em Londres numa época em que Melanie era a estrela da psicanálise", afirma Moretzon. Ela viveu em Londres de Em 5 de junho de 1994, o Mais! publicou uma entrevista em que Bicudo dizia ter sido chamada de charlatã por seu vanguardismo. Fonte: O Estado de S. Paulo 01 de abril de 2011 | 0h 00 Roberta Pennafort / RIO - O Estado de S.Paulo Eles eram intelectuais, amigos dos mais importantes autores brasileiros de seu tempo, e juntavam livros não como fetichistas que admiram o crescimento da coleção, mas na condição de apaixonados pelo conhecimento. Em 1959, morto num acidente aéreo, o casal de escritores Octavio Tarquinio de Sousa e Lucia Miguel Pereira deixou, no apartamento em que viviam, em Laranjeiras, no Rio, uma biblioteca de cerca de 8,3 mil exemplares, iniciada no início do século 20. Este acervo protegido pelo neto que criavam como filho - Antonio Gabriel, hoje com 73 anos - estará aberto à visitação pública nos próximos meses, na biblioteca que será instalada no novo prédio da Procuradoria-Geral do Estado, no centro. Enquanto as obras no edifício não são concluídas, o conteúdo das estantes de cedro maciço pode ser conhecido no site www.octavioelucia.com. Para os pesquisadores, em especial os que se debruçam sobre o período imperial, é uma fonte e tanto. Sousa é autor dos dez volumes de História dos Fundadores do Império do Brasil, lançados nos anos 50 e referência até hoje. Para os curiosos, estão disponíveis dedicatórias amorosas de escritores como Carlos Drummond de Andrade, que os trata como "gente do melhor coração" numa poesia na folha de rosto de Claro Enigma (1951). Em 1947, Graciliano Ramos escrevera, na de Caetés: "Caro Tarquínio e caríssima Lucia: façam-me o favor de não ler esta miséria". Guimarães Rosa, Manuel Bandeira, Jorge Amado, Gilberto Freyre, Monteiro Lobato, Vinicius de Moraes... Pense num grande nome das nossas letras, e haverá uma assinatura sua num livro dessa coleção. O valor do conjunto é incalculável. Antonio Gabriel resistiu durante esses 52 anos a investidas de sebos e até de universidades norte-americanas. "Esta é a biblioteca mais importante do Brasil em termos de primeiro reinado. Sempre tive consciência de que deveria ficar no Brasil. É um tesouro nosso, ainda que os governos estejam se lixando para isso. Mais de 30% dos livros têm dedicatórias. Estou prestando uma homenagem àquelas duas pessoas que eu amava. A biblioteca ficará una, com o nome deles e acessível", orgulha-se. |
Fonte: O Estado de S. Paulo Caderno: Caderno 2 31 de março de 2011 | 9h 56 AE - Agência Estado A Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) realizou, anteontem à noite, a cerimônia de entrega de seus prêmios para os melhores das artes no ano de 2010. A festa de premiação, no Teatro Paulo Autran do Sesc Pinheiros, teve como mestres de cerimônia os atores Dan Stulbach e Irene Ravache. A atriz foi ainda uma das premiadas da noite, por sua atuação como Clô na novela "Passione", exibida na Rede Globo. A cerimônia, dirigida por Alexandre Reinecke, ainda foi intercalada por apresentações da cantora e performer Silvia Machete, premiada como melhor show de 2010. No total, foram contempladas 11 categorias pela APCA, incluindo, entre elas, a arquitetura, que faz sua estreia na premiação. Antes de todos, o professor e editor Jacob Guinsburg subiu ao palco para receber o Prêmio Especial por seu incansável trabalho na Editora Perspectiva. Para que a cerimônia fosse mais ágil, Dan Stulbach e Irene Ravache anunciavam os premiados de cada categoria de uma só vez. Todos subiam ao palco para receber, cada um, seu troféu. Na categoria artes visuais, das mais tradicionais da premiação, a artista gaúcha Regina Silveira recebeu o Grande Prêmio da Crítica pela intervenção "Tramazul", que realizou na fachada do Masp (sua criação ainda está no prédio, na Avenida Paulista). Outro destaque de arte foi a escolha do consagrado designer Alexandre Wollner por seus cartazes. A guinada da Fundação Bienal de São Paulo depois de anos de crise, conduzida pela nova direção encabeçada pelo empresário Heitor Martins, também foi homenageada como Iniciativa Cultural. Algumas personalidades mais conhecidas do público não puderam comparecer à premiação. Entre elas, o diretor teatral Gabriel Villela (na categoria Teatro Infantil, venceu pela criação do figurino de "O Soldadinho e a Bailarina"); a cantora, pesquisadora e apresentadora Inezita Barroso (Grande Prêmio da Crítica em Música Popular); a escritora Adélia Prado (prêmio Poesia em Literatura); e a atriz Ana Paula Arósio (premiada em Cinema por seu papel no filme "Como Esquecer"). Mas, ao mesmo tempo, o ator Wagner Moura, grande sucesso como o Capitão Nascimento do filme "Tropa de Elite", contemplou a cerimônia, comparecendo e sendo muito aplaudido quando subiu ao palco para receber seu troféu. Outra aparição importante foi do diretor de teatro Antunes Filho que, na categoria mais tradicional da premiação, foi contemplado com o Grande Prêmio da Crítica de Teatro "pela inestimável contribuição". Já na categoria Rádio, entre os destaques estão a premiação para Juca Kfouri pelos 10 anos à frente do programa CBN Esporte Clube (Grande Prêmio da Crítica). E o prêmio de melhor cobertura jornalística para a Eldorado/ESPN pela cobertura da Copa do Mundo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. Confira algumas categorias: Teatro Grande prêmio da crítica: Antunes Filho; Espetáculo: "12 Homens e Uma Sentença"; Diretor: Rodolfo García Vazquez ("Roberto Zucco"); Autor: Samir Yazbek ("As Folhas do Cedro"); Ator: Danilo Grangheia ("Êxodos"); Atriz: Bel Kovarick ("Dueto para Um"); Prêmio especial: "O Idiota". Cinema Filme: "Antes Que o Mundo Acabe"; Documentário: "Terra Deu, Terra Come" (Rodrigo Siqueira); Diretora: Laís Bodanzky ("As Melhores Coisas do Mundo"); Fotografia: Mauro Pinheiro Jr. ("Os Famosos e Os Duendes da Morte"); Roteiro: Luis Bolognesi ("As Melhores Coisas do Mundo"); Ator: Wagner Moura ("Tropa de Elite 2"); Atriz: Ana Paula Arósio ("Como Esquecer"). Arquitetura Obra em São Paulo: CEU Guarulhos Pimentas, (Mario Biselli e Arthur Katchborian); Obra no Brasil: Sede do Sebrae Brasília (Álvaro Puntoni, Luciano Margotto Soares, Jonathan Davies e João Sodré); Obra no exterior: Museu da Memória e dos Direitos Humanos, Santiago do Chile (Mario Figueroa, Lucas Fehr e Carlos Dias). Literatura Romance: "Minha Mãe se Matou sem Dizer Adeus" (Evandro Affonso Ferreira); Ensaio/Crítica: "Ideologia e Contra Ideologia" (Alfredo Bosi); Infanto-juvenil: "Sou Eu!" e "O Nervo da Noite" (João Gilberto Noll); Poesia: "A Duração do Dia" (Adélia Prado); Contos/Crônicas/Reportagens: "Ficção Interrompida" (Diógenes Moura); Biografia: "Memórias de Um Historiador de Domingo" (Boris Fausto); Tradução: Paulo César de Souza ("Obras Completas de Sigmund Freud"). Dança Modelo de Curadoria: Festival Panorama Sesi/Christine Greiner; Percurso: 20 Anos da Lia Rodrigues Cia. de Dança; Pesquisa: Marta Soares ("Vestígios"); Melhor intérprete: Marina Salgado ("Jardim Noturno"); Melhor Criador-intérprete: Zélia Monteiro ("Seis Estudos para Flutuar"); Melhor iniciativa: Projeto Dança para Crianças; Modelo de Difusão: Lugar/João Andreazzi Fonte: O Estado de S. Paulo 01 de abril de 2011 | 0h 00 Camila Molina - O Estado de S.Paulo O jovem curador e cientista político João Grinspum Ferraz, de 28 anos, começou a colecionar arte em 2006. Já o engenheiro Francisco de Assis Esmeraldo, o empresário Jayme Vargas e o advogado Rodrigo Monteiro de Castro colecionam há mais tempo. Agora os quatro se reuniram para criar uma galeria de arte própria, a Transversal, que será inaugurada amanhã, com mostra do fotógrafo britânico Clay Perry. A exposição, inédita no Brasil, reúne retratos em preto e branco que Perry realizou em Londres na década de 1960, entre eles, de artistas brasileiros como Mira Schendel e Sergio Camargo. Instalada em uma construção na Barra Funda, a Galeria Transversal fugiu do esquema do "cubo branco" e, mesmo tendo seu espaço reformado, guarda estruturas de madeira do teto e tem janelas e uma sacada abertas para a paisagem industrial exterior e decadente do bairro. Vai ser um local de representação de artistas, já tendo em seu time André Farkas (Treco), o próprio Clay Perry, Ding Musa, Ester Grinspum, Fabrício Lopes, Felipe Góes, Guga Szabzon, José Guedes, Leila Tchopp, Nelson Kon e Wagner Morales. "A ideia é não passar de 15 a 16 nomes e queremos flertar com a realização de exposições de cerca de um mês e meio de duração", conta Ferraz. Segundo o sócio-diretor da Transversal, a iniciativa de criar a galeria "tem pouco a ver" com a boa safra do mercado de arte brasileiro - especialmente, em São Paulo - e com o boom da economia brasileira. "Foi uma maneira de aglutinar pessoas e havia um monte de artistas saindo de galerias", ressalta. A próxima mostra da Galeria Transversal será da artista Ester Grinspum, a ser aberta em 7/5. GALERIA TRANSVERSAL R. do Bosque, 206, telefone 3392-5287. 11 h/ 20 h (sáb., 11h/ 14h; fecha domingo e segunda.) Abertura amanhã, 11 h. Até 30/4. |
A coletânea O Rio de Joaquim Manuel de Macedo traz à tona a vasta, variada e quase desconhecida produção de textos de não ficção que o autor de[br]A Moreninha (1844) publicou em jornais e revistas 26 de março de 2011 Lilia Moritz Schwarcz - O Estado de S.Paulo Joaquim Manuel de Macedo ficou famoso por causa de A Moreninha (1844), romance que virou sinônimo do gênero romântico no Brasil e já fez muitas moçoilas e rapazes barbados chorarem. Dr. Macedinho, como era popularmente conhecido, editaria a obra às próprias custas e não se arrependeria: o livro converteu-se em nosso primeiro best-seller. A despeito do sucesso, o ganha-pão do escritor seria obtido a partir da atividade como jornalista, articulista e cronista. Médico de formação, Macedo enveredaria pela literatura de maneira ampla. Num momento em que parecia natural cruzar a ponte entre jornalismo e literatura, Macedinho sagrou-se personagem descolado no Rio de Janeiro de Pedro II. E começou cedo: com apenas 24 anos, além de se dedicar ao romance passou às páginas de jornal. Porém, se sua obra ficcional é conhecida, já a produção jornalística permanece pouco divulgada. A desproporção é gritante, uma vez que o escritor publicou durante quatro décadas em vários órgãos cariocas. Apenas no sisudo Jornal do Comércio, reduto conservador dos mais estáveis, Macedo foi presença cativa durante 25 anos, sem interrupção. Suas colunas ocupavam o espaço prestigioso do rodapé da primeira página de domingo; dia em que a circulação duplicava. O fato é que Macedo sagrou-se principal colunista do Rio de Janeiro, esse centro difusor de vogas do Império. Macedo era mesmo um agitador. Secretário do prestigioso Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, por lá ajudou a criar uma tradição para nossas artes, letras e história. Nosso escritor usaria da Instituição, de suas boas relações e da sua literatura ágil para fortalecer seu grupo, empenhado na construção cultural do País. Junto com Gonçalves Dias, Araújo Porto-Alegre e Gonçalves Magalhães comporia o grupo forte do Imperador que mostraria como as fronteiras entre ficção e não ficção podiam ser porosas. Suas atividades não parariam por aí. Macedo dirigiu A Nação e a revista A Guanabara e como jornalista percorreu a via-crúcis de boa parte dos periódicos da Corte: Biblioteca Brasileira, Correio Mercantil, O Globo, Jornal das Famílias, A Manhã, Marmota Fluminense, A Nação, Ostensor Brasileiro, A Reforma, A Rosa Brasileira, Revista Popular, Revista do IHGB, Semana Ilustrada, Minerva Brasiliense. É em torno dessa produção tão gigantesca como desigual que se debruça Michelle Strzoda em O Rio de Joaquim de Macedo. O texto introdutório, a despeito do amplo apanhado sobre a atividade jornalística e literária à época, acaba não trazendo biografia mais alentada de Macedo, que permitiria entender a atuação alargada do escritor. Além do mais, não ficam claros os parâmetros utilizados na seleção das crônicas. Não se discute o valor documental da obra, mas a inexistência de critérios claros, faz com que o leitor enfrente textos saborosos e outros que, diante da ação impiedosa do tempo, tornam-se cifrados. Na verdade, o que mais se destaca após a leitura da coletânea é um escritor capaz de discorrer sobre tudo e todos: a cidade e seus personagens, a cultura local, a política e suas falcatruas, os hábitos de leitura, a paisagem tropical idealizada, o cotidiano por vezes tedioso, ou a história dos parcos monumentos locais. Misto de historiador, etnólogo e arauto de curiosidades, Macedo parece mais um recitador da cidade. Há momentos que irão surpreender o leitor, ao notar que o autor de A Moreninha era capaz de vestir a carapuça de crítico ardido: "Vivemos em uma época de pasmosa esterilidade: quando os anos tiverem passado, os vindouros hão de reunir a história toda da geração atual em duas breves: politicou e negociou". Intelectual da capital, não poucas vezes Macedo se dirigiu a ela sem concessão: "As nações têm, como os homens, duas vidas muito distintas: a vida pública e a vida privada; a vida do estado e a vida do lar doméstico". Atento aos novos costumes e modas fáceis, Macedo denunciava a proliferação de jornais, em detrimento de livros; ou o excesso de leis: "Tanto na corte como nos municípios do interior o povo, crismou com o nome de imposturas as posturas da câmara". Irônico, ele desfaz das medidas que pretendiam higienizar a cidade, mas sem investir em sua infraestrutura. Flaneur das ruas do centro carioca, Macedinho brincava com o atraso dos ônibus (que traziam a "tabuleta de oito quando os sinos da igreja marcavam 9 horas da manhã"); com "as desregradas aposentadorias"; com a falta de lisura dos membros da Câmara, definida como "uma noiva sem dote", ou com os atrasos nas obras públicas caracterizados pelo provérbio: "velhos como as obras das Sé". Desfazia também dos "sofistas que sustentam que a alforria de um escravo é um mal que a eles se faz". Aí estava um Macedo à sua maneira abolicionista, autor de Vítimas e Algozes, que, escrito em 1869, logo criou grande polêmica. A autora da coletânea acertadamente reproduz na íntegra as Memórias da Rua do Ouvidor. Aqui está o mais importante relato sobre essa rua que virou símbolo de elegância entre os bem nascidos da corte. Era lá que se praticava o ritual do ver e ser visto e Macedo flagra, com um misto de encanto e escárnio, essa nova agenda da corte, que se veste à europeia mesmo enfrentando um calor de 40 graus. Modistas franceses, ourives, floristas, lojas de fazendas, cabeleireiros, perfumarias, ateliês de fotografia, restaurantes, nada escapa ao olhar de Macedo, ele próprio um habitué local. Mas afora alguns bons exemplos, o grosso das crônicas parece ter perdido seu frescor original. A coletânea terá grande valor para investigadores, mas talvez seja demasiado especializada para o público geral. Conforme brincava Caio Prado Júnior, quando se pretende justificar uma pesquisa, nem sempre o argumento de que ela nunca veio a público é suficiente. Por vezes, é preciso indagar sobre seus limites. Nesse caso, uma seleção mais apurada salvaria a memória desse autor, que bem merece que sua obra de não ficção ganhe novos leitores. LILIA MORITZ SCHWARCZ É PROFESSORA DE ANTROPOLOGIA DA USP E AUTORA, ENTRE OUTROS, DE O SOL DO BRASIL: NICOLAS-ANTOINE TAUNAY E AS DESVENTURAS DOS ARTISTAS FRANCESES NA CORTE DE D. JOÃO (COMPANHIA DAS LETRAS) |
Fonte: O Estado de S. Paulo Somente uma instituição pública pode cuidar do acesso à herança cultural 28 de março de 2011 | 0h 00 Robert Darnton, do The New York Times - O Estado de S.Paulo O juiz federal Denny Chin, de Manhattan, rejeitou na terça o acordo entre o Google, que pretende digitalizar todos os livros já publicados, e um grupo de autores e editores que processou a empresa por violações de copyright. Essa decisão representa uma vitória para o bem público, evitando que uma única corporação monopolize o acesso à nossa herança cultural comum. A Solvay. Biblioteca criada em 1902: o Google mostrou como transformar a riqueza intelectual que jaz inerte nas prateleiras Independentemente disso, não devemos abandonar o sonho do Google de tornar todos os livros do mundo acessíveis para todos. Em vez disso, devemos construir uma biblioteca pública digital, oferecendo cópias digitais gratuitas aos leitores. É verdade que há muitos problemas - legais, financeiros, tecnológicos e políticos - pelo caminho. Mas todos eles podem ser resolvidos. Consideremos as questões legais levantadas pelo acordo rejeitado. Iniciado em 2005, o projeto do Google para a digitalização dos livros permitiu que o conteúdo de milhares de títulos fosse incluído nos resultados das buscas na rede, levando o Author"s Guild e a Associação Americana de Editores a afirmar que os trechos mostrados aos usuários representavam uma violação dos direitos autorais. O Google poderia ter se defendido, alegando que fazia uso legítimo das obras, mas a empresa preferiu negociar um acordo. O resultado foi um documento extenso e complicado conhecido como Acordo Emendado (Amended Settlement Agreement, em inglês) que simplesmente fatiava o bolo. O Google venderia o acesso aos seu banco de dados digitalizado, e os lucros seriam partilhados com os querelantes, que então se tornariam seus sócios. A empresa ficaria com 37% do total; os autores receberiam 63%. Essa solução equivalia a uma alteração das leis do direito autoral por meio de um processo individual, conferindo ao Google uma proteção legal que seria negada aos seus concorrentes. Foi esse o principal motivo da objeção do juiz. Em audiências no tribunal realizadas em fevereiro de 2010, várias pessoas disseram que o Author"s Guild, composto por 8 mil membros, não as representava e nem aos muitos autores de publicaram livros nas últimas décadas. Algumas afirmaram preferir que suas obras fossem oferecidas sob condições diferentes; outras queriam até que seus livros fossem oferecidos gratuitamente. Mas o acordo definia os termos para todos os autores, a não ser que eles notificassem especificamente o Google de sua intenção de não participar dele. Em outras palavras, o acordo não fez aquilo que se espera dos documentos desse tipo, como corrigir uma suposta violação dos direitos autorais ou proporcionar indenizações pelos incidentes anteriores; em vez disso, o acordo parecia determinar como seria o futuro da evolução do mundo digital dos livros. O juiz Chin abordou esse ponto ao se concentrar na questão dos livros órfãos - ou seja, os protegidos pelo direito autoral cujos detentores dos direitos não tinham sido identificados. O acordo confere ao Google o direito exclusivo de digitalizar e comercializar o acesso a esses livros sem ser alvo de processos por violações de copyright. De acordo com o juiz, essa provisão conferiria ao Google "um monopólio de fato sobre obras de autoria indeterminada", levando a graves preocupações com a formação de um truste. Chin convidou o Google e os querelantes a reescrever outra vez os termos do acordo, talvez alterando os dispositivos de inclusão e exclusão dos participantes. Mas o Google pode muito bem se recusar a alterar sua estratégia comercial básica. É por isso que o que realmente precisamos é uma biblioteca pública digital. Uma coalizão de fundações arrecadaria o dinheiro necessário (as estimativas do custo da digitalização de uma página variam muito, de US$ Diminuir a importância disso e considerar o episódio como meramente quixotesco equivaleria a ignorar os projetos digitais que se mostraram valiosos e práticos ao longo dos últimos 20 anos. Todas as grandes bibliotecas de pesquisa já digitalizaram partes de seus acervos. Iniciativas de larga escala como a Knowledge Commons e o Internet Archive já digitalizaram muitos milhões de livros por iniciativa própria. Alguns países também se mostram determinados a bater o Google no seu próprio jogo ao digitalizar todo o conteúdo de suas bibliotecas nacionais. A França está gastando 750 milhões na digitalização de seus tesouros culturais; a Biblioteca Nacional da Holanda tenta digitalizar cada livro e jornal publicados no país desde 1470; Austrália, Finlândia e Noruega estão se dedicando a esforços semelhantes. Talvez o próprio Google pudesse ser recrutado para a causa da biblioteca pública digital. A empresa já digitalizou cerca de 15 milhões de livros; desses, 2 milhões são de domínio público, podendo ser entregues à biblioteca como ponto de partida do seu acervo. A empresa não perderia nada com esse gesto de generosidade. Por meio da magia tecnológica e da própria audácia, o Google mostrou como podemos transformar a riqueza intelectual de nossas bibliotecas, grandes conjuntos de livros que jazem inertes nas prateleiras. Mas somente uma biblioteca pública digital dará aos leitores aquilo que eles necessitam para enfrentar os desafios do século 21 - um vasto acervo de conhecimento que possa ser consultado, gratuitamente, por qualquer um e a qualquer momento. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL ROBERT DARNTON É PROFESSOR E DIRETOR DA BIBLIOTECA DA UNIVERSIDADE HARVARD Fonte: O Estado de S. Paulo 26 de março de 2011 | 0h 00 Raquel Cozer - O Estado de S.Paulo FBN planeja biblioteca para empréstimo de e-books A criação de uma biblioteca pública para empréstimo de livros digitais, nos moldes da desenvolvida pela New York Public Library, será uma das prioridades da Fundação Biblioteca Nacional na gestão de Galeno Amorim. Para pilotar isso, o presidente da FBN convidou Carlo Carrenho, sócio fundador do Publishnews, ao cargo de coordenador-geral de pesquisa e editoração. Carrenho cuidará ainda do programa do livro popular, que inclui a criação de pontos de vendas de títulos com preços abaixo de R$ 10. Como permitem acordos com o mercado, esses projetos podem evoluir apesar da possível redução nas verbas da FBN, decorrente do corte no orçamento do MinC. DIGITAL-2 Nova livraria virtual Está prevista para 28 de abril a estreia de uma loja virtual da Abril que, entre outras coisas, entrará com força na venda de livros digitais. A empresa fechou acordo esta semana com a distribuidora Xeriph para usar sua base de dados e vem negociando com editoras. Quem já viu o projeto diz que ele tem o design todo cor-de-rosa. DIGITAL-3 Filosofia eletrônica Os primeiros e-books nacionais de livros dos filósofos alemães Karl Marx e Friedrich Engels chegam ao mercado em abril. A Boitempo lançará nove títulos da Coleção Marx e Engels acrescidos de textos inéditos, como os primeiros estudos de Bruno Bauer (estes em A Questão Judaica). Simultaneamente, sai em papel o volume O 18 de Brumário de Luis Bonaparte. |
Fonte: Folha de S. Paulo Caderno: Ilustrada José Paulo Cavalcanti Filho lança primeira biografia brasileira de Fernando Pessoa , em que revela 55 novos heterônimos MARCO RODRIGO ALMEIDA DE SÃO PAULO José Paulo Cavalcanti Filho tinha um objetivo quando iniciou sua biografia de Fernando Pessoa (1888-1935): descobrir quem era o "homem real" por trás do grande poeta português. Após oito anos de pesquisa, o autor e advogado pernambucano acabou deparando-se não com um, mas com 127 "Pessoas". É esse o número de heterônimos do poeta catalogado pelo livro "Fernando Pessoa: Uma (quase) Biografia", que Cavalcanti lança agora. As múltiplas personas de Pessoa vão muito além de Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, e superam também o que pensavam os especialistas. Cavalcanti cita no livro que, no início dos anos 1990, eram conhecidos 72 heterônimos de Pessoa. O livro acrescentou 55. O conceito de heterônimo que adotou é amplo e não se restringe à definição padrão: "nome imaginário que um criador identifica como o autor de suas obras e que apresenta tendências diferentes das desse criador". Inclui todos os nomes, tendo estilo próprio ou não, com os quais o poeta assinou seus textos. A decisão pode ser contestada, mas a intenção de Cavalcanti nunca foi fazer uma biografia convencional. As excentricidades já começam pelo subtítulo: "Uma (quase) Autobiografia". O autor refere-se ao trabalho como o "livro que escrevi com meu amigo Pessoa". A "amizade" é das mais antigas. Começou em 1966, quando Cavalcanti leu "Tabacaria", um dos principais poemas do autor. A partir daí, viria a montar umas das principais coleções sobre vida e obra de Pessoa. O poeta deixou mais de 30 mil páginas com anotações sobre si mesmo, literatura, família e fatos cotidianos. Cavalcanti usou tantos trechos que chega a dizer que seu livro tem "mais frases de Pessoa do que minhas". "Mas não se trata", explica, "de Pessoa falando sobre si, é a palavra de Pessoa falando sobre ele. Ou melhor: é o que quero dizer, mas por palavras dele". Cavalcanti foi ainda além: para dar unidade estilística ao texto, tentou escrever como Pessoa. Reduziu os adjetivos e adotou outro hábito dele: o uso, em média, de três vírgulas antes de um ponto final. SEM IMAGINAÇÃO Durante a pesquisa, Cavalcanti foi até quatro vezes por ano a Portugal. Leu centenas de documentos e entrevistou parentes e pessoas que conviveram com Pessoa. Dessas andanças, saiu com a certeza de que o poeta é o autor "menos imaginativo" que existe. "Tudo o que escreveu estava realmente à volta dele. Não tinha nada inventado." Como exemplo, cita "Tabacaria". O poema menciona cinco personagens e Cavalcanti revela que todos realmente existiram e eram próximos do poeta. Quando se trata de Pessoa, contudo, nem tudo é claro. "Sabes quem sou eu? Eu não sei", já advertia o poeta. Sobre sua vida sexual ainda paira uma imensa dúvida. Teria sido gay? Cavalcanti acha que sim, embora não existam provas. Também não há certeza sobre se teria ou não transado com Ophelia, seu mais conhecido relacionamento (Cavalcanti pensa que não foram além de beijos ardentes e leves toques nos seios). Cultivar mistérios, ao que parece, fazia parte do estilo de Pessoa, e isso também Cavalcanti tentou incorporar. O poeta tinha por hábito, diz o biógrafo, embaralhar as datas. O heterônimo Alberto Caeiro, por exemplo, morreu em 1915, mas há textos datados de 1930 atribuídos a ele. No prefácio do livro, Cavalcanti também colocou uma data futura: 13/6/2011. Dupla homenagem, já que Pessoa nasceu nesse dia, em 1888 Fonte: Folha de S. Paulo Caderno: Ilustrada CRÍTICA BIOGRAFIA Estilo do biógrafo rivaliza com o de Pessoa Livro sobre o poeta português traz esforço notável de pesquisa, mas troca literatura por "verdade" biográfica O OBJETIVO NÃO É INTERPRETAR, MAS BUSCAR RELAÇÕES ENTRE VIDA E OBRA, PARA QUE O INICIANTE NÃO SE ILUDA CARLOS FELIPE MOISÉS ESPECIAL PARA A FOLHA O esforço é notável: milhares de documentos compulsados, dezenas de pessoas entrevistadas, em três continentes, e toda a vasta obra de Fernando Pessoa percorrida palmo a palmo. Resultado: 700 e tantas páginas de comovida homenagem ao poeta, famoso pelos heterônimos. Trata-se de um relato biográfico em que o fio narrativo, abrindo mão de foco ou finalidade, constantemente envereda por atalhos e digressões. Podem levar das alfaiatarias, barbearias e cafés frequentados pelo poeta, às casas onde morou e aos escritórios onde trabalhou. De uma antologia não comentada de partes da obra às hipóteses relativas ao namoro com Ophelia e à sexualidade em geral, e muita coisa mais. "Não é um livro para especialistas", afiança o autor, já que não lida com literatura, mas tem o mérito de reunir no mesmo lugar uma enorme quantidade de informações (fantasias à parte) até então dispersas. E isso pode ser útil a... especialistas. SEM INTERPRETAÇÃO Modestamente, porém, o autor considera a biografia um "simples guia para não iniciados". Por isso, Cavalcanti não arrisca nenhuma "nova interpretação". Seu objetivo, com efeito, não fazer interpretações, mas buscar relações entre vida e obra, a fim de que o iniciante não se iluda julgando que vai lidar com poesia ou literatura: é tudo, só, uma questão de "verdade" biográfica. Assim, ficamos sabendo (um exemplo, entre muitos) que, no poema "Tabacaria", a pequena dos chocolates "é sua sobrinha Manuela Nogueira" -"como ela própria me confessou", acrescenta o autor. O especialista, se quiser, que continue a buscar suas interpretações. MÁSCARAS O subtítulo diz: "Uma (Quase) Autobiografia". É que o escritor ilustra o seu próprio texto (sem aspas) com abundantes frases soltas (já agora entre aspas), livremente extraídas da obra pessoana. Cleonice Berardinelli, na apresentação do livro, vai direto ao ponto: "Essas aspas funcionam como uma espécie de nova máscara, desta vez aplicada à face do autor deste novo livro". O que temos, então, nem "auto" nem "quase auto". Trata-se apenas de uma biografia, gênero híbrido em que a têmpera do biógrafo às vezes rivaliza com a do biografado, quem sabe para reforçar a homenagem. CARLOS FELIPE MOISÉS é professor de literatura da USP e autor de "O Poema e as Máscaras" (1981), "Fernando Pessoa: Almoxarifado de Mitos" (2005) e "Conversa com Fernando Pessoa" (2008), entre outros livros FERNANDO PESSOA: UMA QUASE AUTOBIOGRAFIA AUTOR José Paulo Cavalcanti Filho EDITORA Record QUANTO R$ 79,90 (736 págs.) AVALIAÇÃO regular |
Notícias da Semana - 26/03 até 01/04/2011 - Parte 2
sábado, 2 de abril de 2011
Postado por Viviane Rosa às 21:25
Marcadores: acervos especiais, artes, autores, Biblioteca, Biografia, escritores
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